domingo, 30 de maio de 2010

Limpando a casa

A minha casa andava suja, cheia de pó e teias de aranha por todos os lados, parecia até que estava abandonada. E no vazio das salas e quartos, pairava no ar perguntas sem respostas. As cortinas empoeiradas não deixavam dúvidas de que ali não se tinha zelo e nem apego, como a aparência de quem falhou. Dentro daquela casa, quem vivia ali não se importava com quem estava lá fora, ou mesmo dentro. É fácil perder-se naquele emaranhado de coisas espalhadas pelo chão, um desinteresse manso. Desviando subitamente o rosto se via plantas secas em vasos antigos. Cercado por muros imponentes e altos portões, ninguém conseguia ter acesso. O desleixo incomodava mas não era doloroso, pois tudo ali poderia ser melhor. Sentei na soleira da porta e vi no que transformei o meu lar, e me senti submergida de arrependimento. A casa era bonita acima da média, com alicerces firmes e telhados em perfeitas condições. Mesmo assim, eu deixei de vê-la como ela realmente era. Resolvi arregaçar as mangas e limpar tudo. Depois de pensar bastante decidi começar pela cozinha, lá se alimentava o corpo e precisava estar limpa e leve. Faxinei tudo, das paredes até as panelas engorduradas, e de longe já podia se sentir o cheiro das frutas servidas na mesa forrada com uma toalha de uma brancura de arder os olhos. De lá fui ao banheiro, que estava sujo e mal cheiroso, como a saúde de quem não se cuida e se previne. A vassoura foi esfregada no chão com tanta força que ficou um brilho intenso e as latrinas já não mais pareciam saídas de uma porcilga e agora cheiravam a eucalipto. De todo ambiente foram tiradas as teias e qualquer grão de poeira. No quarto, os livros foram limpos e arrumados nas prateleiras como merecem, roupa de cama trocada e esticadinhas como manda o figurino, todas as roupas dobradas e arrumadas na ordem e por cores, e o disco de Vinícius já tocava um samba para voltar a aquecer o coração. Lá estavam guardados todos os meus bens, minha memória e as coisas que eu mais gostava, não podia deixar que meu quarto continuasse escuro, sem vida e em desordem. E em mim, senti voltar a vontade de renovar que estava perdido em algum lugar no meio daquela bagunça. A sala ampla que a tempos já não era mais a mesma, de tantos entulhos e poeira, foi limpa com todo cuidado e detalhe que merece, afinal é lá que se tem a primeira impressão da casa e se recebe os convidados. Foi mudado a posição dos móveis, as plantas regadas, flores recém cochidas enfeitavam a mesa de jantar e a sujeira que era jogada pra baixo do tapete, foi limpa e esquecida como quem quer esquecer um passado triste e viver apenas alegrias. A imagem da sala era outra, revigorada, tão límpida e cheirosa que me deu uma levíssima embriagez com seu novo ar. Pronto, tudo limpo! Dentro da casa sim, mas faltava o jardim, que estava cheio de folhas secas e plantas em estado terminal, como uma decepção com as pessoas que nos rodeiam. Lembrei de como era o jardim antigamente, as plantas eram lindas e com flores de vários tipos e formatos, mas até o belo morre com o descuido. Eu não podia mais deixar isso acontecer. Fiz jardinagem em todo espaço, podei, arrumei, recuperei e tudo foi começando a voltar a ficar verdinho e brotando novas flores, novos amigos. Depois de horas de trabalho, a casa já não era mais a mesma, não estava mais abandonada. Voltou a ter um dono. Agora era ela, a casa que eu sempre vivi, limpa e com tudo em seu devido lugar. Feliz, sentei na rede da varanda e balançando-me com um livro no colo, sem nem ao menos tocá-lo tamanho o êxtase de estar em casa novamente. A casa que eu sempre fui feliz. O meu eu, a minha casa.